Agony ANGÚSTIA. O sujeito apaixonado, do sabor de uma ou outra contingência, se deixa levar pelo medo de um perigo, de uma mágoa, de um abandono, de uma reviravolta - sentimento que ele exprime sob o nome de angústia. 1. Esta noite voltei sozinho ao hotel; o outro decidiu retornar mais tarde. As angústias já estão lá, como o veneno preparado (o ciúme, o abandono, a inquietude); elas esperam apenas que passe um pouco de tempo para poder decentemente se declarar. Pego um livro e um sonífero, "calmamente". O silêncio deste grande hotel é sonoro, indiferente, idiota (ronron longíquo das banheiras se esvaziando); os móveis, as lâmpadas são estúpidas, nada de amigável onde se aquecer ("Estou com frio, voltemos a Paris). A angústia cresce, observo sua progressão, como Sócrates falando (eu lendo) sentia aumentar o frio da cicuta; eu a escuto se nomear, sobressair, como uma figura inexorável, do fundo das coisas que estão lá. (E se, para que qualquer coisa aconteça, eu fizesse uma promessa?) 2. O psicótico vive sob o temor do aniquilamento (do qual as diversas psicoses seriam apenas defesas). Mas "o temor clínico do aniquilamento é o temor de um aniquilamento que já foi experimentado (primitive agony) [...] e há momentos em que um paciente precisa que lhe digam que o aniquilamento cujo temor mina sua vida já ocorreu". O mesmo, parece, se passa com a angústia de amor: ela é o temor de um luto que já ocorreu, desde a origem do amor, desde o momento em que fiquei encantado. Seria preciso que alguém pudesse me dizer: "Não fique mais angustiado, você já o(a) perdeu". Roland Barthes, in Fragmentos de um discurso amoroso.
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Julho 2017
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