ANTIMUNDO Para o João Diogo plágio manhoso do big-bang a matéria do poema expande, arrefece tão estranhamente se demora e permanece semelhando o Universo o poema é a imagem-espelho de um corpo sem reflexo: a poesia oco assimétrico, residual desse princípio colocada em lugar dubitativo, separada quase sempre do buraco negro a que chamam literatura poder-se-á supor que poucos são os poetas capazes de acelerar partículas de modo a ver-se não só o que a luz já percorreu mas a região mais central do nada, o pátio furioso da potência e neste lugar de substâncias, de objectos as palavras são figuras do imundo, coisas que sobraram do estampido inaugural desse ‘dia inicial inteiro e limpo’ que culminou no lugar a menos deste texto breve logaritmo sem aplicação ou saída resta ao poeta o embuste de afirmar o que propende para o infindo espiar o acesso que cada coisa consente pela fissura do milagre e dá pelo nome de imprevisto, ou acidente a criança na rua abrindo o caixote do lixo onde alguém sem saber depositou o assombro de um balão de hélio branco ainda cheio que se soltou e subiu à laia de lua ao fim da tarde ao pé de casa a criança pasmou, entristeceu depois mais tarde lembrou-se: ‘tens de escrever um poema sobre o balão que voou do lixo e não agarrámos’ um poema é a coisa mais triste que há e escrevi Miguel-Manso.
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Julho 2017
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