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  ESCORRER

Escorrer.

#181

3/31/2017

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REVELAÇÕES
 
                                                                                                                                                                                                                       para Jacques Vallée
 
frio nas fronteiras de topázio
abandonei-me ao mês do Deus do vento
floresce no meu corpo um ponto secreto
entre os cometas vivos do êxtase
Roberto Piva.
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#180

3/30/2017

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DESFEITA

cortei cabelo,
unhas
e todos os carboidratos.

os meus pulsos,
porém,
ainda estão intactos.
Iara Maria Carvalho.
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#179

3/29/2017

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DISCURSO

no dize-tu-direi-eu
havia um que dizia
quer dizer é como quem diz
que o mesmo é não dizer nada
tenho dito
Alexandre O´Neill
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#178

3/27/2017

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Velho

Estás morto, estás velho, estás cansado!
Como um suco de lágrimas pungidas
Ei-las, as rugas, as indefinidas
Noites do ser vencido e fatigado.

Envolve-te o crepúsculo gelado
Que vai soturno amortalhando as vidas
Ante o repouso em músicas gemidas
No fundo coração dilacerado.

A cabeça pendida de fadiga,
Sentes a morte taciturna e amiga,
Que os teus nervosos círculos governa.

Estás velho estás morto! Ó dor, delírio,
Alma despedaçada de martírio
Ó desespero da desgraça eterna.
Cruz e Sousa.
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#177

3/24/2017

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O SEGREGO
[Jardim Amália Rodrigues, 1961]


                                                                                                                                                                                                Vão alguns em busca de beleza, dizem.
                                                                                                                                                                                                                                     Herberto Helder

Os meus dedos já souberam
de cor a perfeição.

A morte era o menos.
Só a beleza nos parecia intolerável
se não a despedaçássemos,
voz por voz, compasso a compasso,
numa harmonia mais dócil. Menos urgente
do que os músculos que ensaiávamos
todos os dias sem nos tocarmos.

Agora ouço outras mãos
a tactear o mesmo mistério e 
é como segredar, pianississimo,
ao ouvido de alguém demasiado longe,
quando afinal adormeceste apenas
dentro de mim, com as garras
cravadas ao de leve na memória. 
Inês Dias.
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#176

3/22/2017

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Arte poética
[A Charles Morice]

Antes de tudo, a Música. Preza
Portanto, o Ímpar. Só cabe usar
O que é mais vago e solúvel no ar
Sem nada em si que pousa ou que pesa.

Pesar palavras será preciso,
Mas com certo desdém pela pinça:
Nada melhor do que a canção cinza
Onde o Indeciso se une ao Preciso.

Uns belos olhos atrás do véu,
O lusco-fusco no meio-dia
A turba azul de estrelas que estria
O outono agônico pelo céu!

Pois a Nuance é que leva a palma,
Nada de Cor, somente a nuance!
nuance, só, que nos afiance
o sonho ao sonho e a flauta na alma!

Foge do Chiste, a Farpa mesquinha,
Frase de espírito, Riso alvar,
Que o olho do Azul faz lacrimejar,
Alho plebeu de baixa cozinha!

A eloquência? Torce-lhe o pescoço!
E convém empregar de uma vez
A rima com certa sensatez
Ou vamos todos parar no fosso!

Quem nos dirá dos males da rima!
Que surdo absurdo ou que negro louco
Forjou em jóia este toco oco
Que soa falso e vil sob a lima?

Música ainda, e eternamente!
Que teu verso seja o vôo alto
Que se desprende da alma no salto
Para outros céus e para outra mente.

Que teu verso seja a aventura
Esparsa ao árdego ar da manhã
Que enche de aroma ótimo e a hortelã…
E todo o resto é literatura.
Paul Verlaine.
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#175

3/21/2017

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Resposta a um amigo com novidades de Lisboa em 1658

França está mui doente das ilhargas,
Inglaterra tem dores de cabeça;
Purga-se Holanda, e temo lhe aconteça
Ficar debilitada com descargas.

Alemanha lhe aplica ervas amargas,
Botões de fogo com que convalesça;
Espanha não lhe dá que este mal cresça;
Portugal tem saúde e forças largas.

Morre Constantinopla, está ungida;
Veneza engorda e toma forças dobres;
Roma está bem, e toda a Igreja boa.

Europa anda de humores mal regida;
Na América arribaram muitos pobres:
estas as novas são que há de Lisboa.
Gregório de Matos.
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#174

3/20/2017

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ANTES DO COMEÇO

Ruídos confusos, claridade incerta.
Outro dia começa.
Um quarto em penumbra
e dois corpos estendidos.
Em minha fronte me perco
numa planície vazia.
E as horas afiam suas navalhas.
Mas a meu lado tu respiras;
íntima e longínqua
fluis e não te moves.
Inacessível se te penso,
com os olhos te apalpo,
te vejo com as mãos.
Os sonhos nos separam
e o sangue nos reúne:
Somos um rio que pulsa.
Sob tuas pálpebras amadurece
a semente do sol.
                            O mundo
No entanto, não é real,
                          o tempo duvida:
Só uma coisa é certa,
o calor da tua pele.
Em tua respiração escuto
as marés do ser,
a sílaba esquecida do Começo.
Octavio Paz.
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#173

3/17/2017

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De profundis amamus

Ontem às onze
fumaste
um cigarro
encontrei-te
sentado
ficámos para perder
todos os teus eléctricos
os meus
estavam perdidos
por natureza própria

Andámos
dez quilómetros
a pé
ninguém nos viu passar
excepto
claro
os porteiros
é da natureza das coisas
ser-se visto
pelos porteiros

Olha
como só tu sabes olhar
a rua os costumes
O Público
o vinco das tuas calças
está cheio de frio
é há quatro mil pessoas interessadas
nisso

Não faz mal abracem-me
os teus olhos
de extremo a extremo azuis
vai ser assim durante muito tempo
decorrerão muitos séculos antes de nós
mas não te importes
muito
nós só temos a ver
com o presente
perfeito
corsários de olhos de gato intransponível
maravilhados maravilhosos únicos
nem pretérito nem futuro tem
o estranho verbo nosso
Mário Cesariny.
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#172

3/15/2017

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levo algum tempo para escrever
modelos cartas comunicações
ouvindo notas limpas ao fundo
e vozes roucas também rasgadas
o tempo urge nas telas
e perdemos o horário do ônibus sempre
inventando desculpas que nos acobertem
nas repartições 

com gente insossa e desinteressante
levo tanto tempo para gostar de alguém
que já nem me surpreendo com a urgência
que os outros impõem em nossas relações
as notas continuam ao fundo
e entre um ou outro copo de café
vou descobrindo mais um pouco de um corpo
a matéria distante geograficamente
nomes próprios em canções despretensiosas
ônibus atrasados e roupas encharcadas
o suor diário das caminhadas apressadas
vozes roucas nem tão rasgadas gritam na repartição.
Rafael Braga.
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